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O objetivo desta Seção é apresentar os primórdios dos Quadrinhos Disney no Brasil, especialmente cotejando à evolução que ocorreu em alguns outros países, naquele período em que publicar "histórias em quadrinhos" era plena vanguarda.

Inicialmente, iremos focalizar esta evolução no Brasil e alguns países próximos, como a Argentina (face ao paralelismo da Editora Abril, como que operando como em duas unidades coadjuvante nestes dois países, o que ainda será objeto de análise), e tecer algumas considerações sobre a evolução de suas publicações.

Isto, pois sabemos que estas edições antigas são não apenas raras, mas também caras, então objetivamos possibilitar ao colecionador que ainda não adentrou nas peças dos anos anteriores a 1960, uma breve visão do que se passou em tais "priscas eras" dos Quadrinhos Disney no Brasil.

Este estudo não possui caráter científico "stricto sensu", posto que produzido por colecionador, e orientado a colecionadores e outros aficionados dos quadrinhos Disney. Sendo assim, prescindiremos de certo rigorismo científico.

Da mesma forma, não nos será possível entrar no mérito da criação dos personagens Disney em si, pois tal envolveria aprofundar-se no perfil sócio-personal do próprio Walt Disney, assim como de Carl Barks e dos roteiristas e desenhistas mais famosos que, por delegação do próprio Disney, auxiliaram-no a imprimir personalidades próprias aos diversos personagens.

A quem se interessar sobre este detalhamento, desde já deixamos recomendados os estudos e publicações do Prof. Roberto Elísio dos Santos, e quando o assunto for as características deste ou daquele desenhista e roteirista, sugiro neste mesmo site, uma pesquisa no link "Mestres Disney".

Quase todos os colecionadores que, algum dia, dedicaram-se a colecionar pelo menos parcialmente algum título de "HQ" Disney da Editora Abril no Brasil, mesmo sem se interessar por efetuar esta coleção de forma completa, acaba por inteirar-se que o marco inicial da Editora Abril está na revista em quadrinhos "O Pato Donald". Esta publicação surgiu em formato maior, intitulada "O Pato Donald - Revista Mensal de Grandes Historietas de Walt Disney", e que doravante trataremos simplesmente como "PD(BR)", ou simplesmente "PD", cujo número um (01) foi editado em julho de 1950.

Esta afirmação não é errónea de todo, se considerarmos o prisma das publicações ainda existentes e correntes.

Em primeiro lugar - e apesar de negado oficialmente pela própria Editora Abril - esta já ensaiou outras publicações antes de julho de 1950.

Além disso, historietas Disney em quadrinhos, ou na forma de textos ilustrados, ou mesmo na forma de tiras, já surgiram muitos anos antes.

O primeiro contato que o leitor brasileiro teve com quadrinhos Disney, na verdade, foi nas páginas do "Tico-Tico", revista que editou as tiras do "Mickey" sem os tradicionais balões de fala e pensamento. No "Tico-Tico", as expressões verbais eram apostas ao rodapé de cada quadrinho. Eram normalmente tiras de no máximo três ou quatro quadrinhos.

        

O Tico Tico

O Tico Tico

(Edição extraordinária - dezembro de 1934)

No "Tico-Tico", "Mickey" era designado por "Ratinho Curioso". A revista "Tico-Tico" foi publicada inicialmente em 1905 e tratou-se da primeira coleção de revistas direcionada especificamente ao público infantil no Brasil, de inspiração nitidamente francesa. Basicamente trazia textos para leitura (para não gerar conflitos demasiados com a Igreja que, na época, não se mostrava muito favorável ao manuseio de textos em quadrinhos por crianças), assim como tiras e historietas, em sua maioria de uma página, no máximo. Clássicos como "Popeye", "Gato Félix", "Pinduca", "Pafúncio", entre criações brasileiras e norte-americanas, eram o foco da publicação.

Os desenhos publicados eram em sua maioria atribuídos ao próprio Walt Disney, ou eventualmente a seu assistente Ub Iwerks. Investigações históricas posteriores demonstraram que tais desenhos na verdade foram de autoria de Gottfredson.

No suplemento "A Gazeta", também conhecida como "Gazetinha", também constavam algumas tiras.

A revista "Suplemento Infantil", posteriormente renomeada para "Suplemento Juvenil", era um suplemento do jornal "A Manhã". Em 1934, já por iniciativa de Adolfo Aizen (futuro Fundador e Presidente da EBAL) passou a publicar também tiras de quadrinhos Disney a partir de 1934, também na mesma forma do "Tico-Tico", ou seja, as falas dos personagens sendo apresentadas ao pé dos quadrinhos.

Assim, algumas cenas das "Sinfonias Alegres" já apareceram a partir do "Suplemento Infantil" número 5, datado de 11.04.1934, em conjunção a um texto com a história respectiva. Na edição número 6, Mickey estréia numa "Sinfonia Singular Colorida (Silly Symphony in Color)", apesar de que publicada em preto-e-branco. Na arte original promanada dos Estados Unidos, havia balões, os quais foram removidos e os diálogos foram transcritos ao pé dos quadrinhos, para manter o "standard" da época.

A edição de 31.10.1938, já então rebatizada para "Suplemento Juvenil", trouxe o "Pato Donald" em tiras de Al Taliaferro, bem como as "Aventuras do Elefante Elmerindo" (que no original chamava-se "Elmer Elephant" e que no Brasil, posteriormente, veio a ser denominado também de "Elefante Bolinha".

Até aqui aludimos apenas a tiras. A seguir deve ser mencionada a revista "Mirim". O "Mirim" era um HQ editado pelo "Grande Consórcio Suplementos Nacionais (GCSN)", fundado por Adolfo Aizen em 14 de março de 1934. Apesar de Adolfo Aizen posteriormente vir a fundar a Editora "EBAL", na década de 1940, aqui se cogita de outra edição.

Já em seguida marcou espaço o "Mirim", um HQ de poucas páginas (dizia-se "gibi fininho" - alguns de 16 páginas, outros de 32 páginas), tri-semanal (saía três vezes por semana), sendo que o que realmente marcou época foi o "Mirim Sexta-ferino", o que chegava às bancas nas sextas-feiras, logicamente.

Mirim (agosto de 1938)

Paralelamente à Revista "Mirim", este Consórcio liderado por Adolfo Aizen editou também uma colecão de livrinhos de bolso, de pequenas dimensões (9,0 cm de largura x 11,2 cm de altura), também conhecidos como "tijolinhos", e que formaram a chamada "Biblioteca Mirim". Cada edição focalizava um tema ou um personagem, sendo narrado na forma de textos, com ilustrações em páginas separadas. A Coleção da "Biblioteca Mirim" principiou em 1937 e foi editada e reeditada praticamente até 1945, havendo sido editados 39 exemplares - do número 1 ao número 39, sendo que apenas os números 16, 18, 20, 21 e 24 focalizavam personagens Disney típicos ou atípicos. São eles:

 

Biblioteca Mirim 16 - "Pinnochio"

Biblioteca Mirim 18 - "Pato Donald"

Biblioteca Mirim 20 - "Camundongo Mickey e os 7 Fantasmas"

Biblioteca Mirim 21 - "Pluto"

Biblioteca Mirim 24 - "Sinfonias Alegres" (com Pato Donald e outros...)

 

As edições 16 e 24 saíram apenas nas publicações mais recentes, conhecidas como "Novíssima Biblioteca Mirim".

Seguem, a seguir, os scans das capas destes cinco "tijolinhos" famosos do GCSN.

 

            

Também as publicações "O Guri", e "O Lobinho", já desde o final dos anos 1930, publicaram dezenas de tiras Disney, mescladas com tiras de outros personagens ou heróis, e em sua maioria na forma antiga de textos com as frases sob a vinheta. A Revista "Gibi", iniciada por Roberto Marinho em 1939, também trazia diversas inserções e tiras dos principais personagens Disney da época - Mickey, Donald, etc..., sendo provavelmente o pioneiro em trazer inserções dos três sobrinhos de Donald, bem como da namorada "Daisy Duck" - Margarida.

Um exemplar único mas notório é a publicação "Saludos Amigos", na versão castelhana do clássico "Você já foi à Bahia".

Saludos Amigos

A Editora "Noite" também publicou entre 1941 e 1943 uma série de doze livrinhos de dimensões similares aos "tijolinhos da Biblioteca Mirim", conhecidos como "Coleção Walt Disney". Numerados de 1 a 12, também eram estruturados na forma de textos, em que algumas ilustrações mesclavam-se textos com desenhos em páginas apartadas. A "Coleção Walt Disney", também referida por "COL-WD" desta época editou os seguintes títulos, sendo que cada exemplar media 14,2 cm de largura x 12,4 cm de altura:

COL-WD  1 - "João Mata 7" (posteriormente: "Mickey, o Alfaiate Valente")

COL-WD  2 - "Pateta"

COL-WD  3 - "O Porquinho Prático"

COL-WD  4 - "Elefante Bolinha" (Elmerindo)

COL-WD  5 - "O Patinho Feio"

COL-WD  6 - "Clarabela"

COL-WD  7 - "Mamãe Pluto"

COL-WD  8 - "Minie - a Namorada"

COL-WD  9 - "Mickey em Apuros"

COL-WD 10 - "Donald vs. Quinquim"

COL-WD 11 - "Sinfonia Campestre"

COL-WD 12 - "Coisas de Pluto"

 

               

              

               

Outra coleção editada pelo Consórcio liderado por Aizen na época é a Coleção "BIG", que foi composta de 16 peças, sempre mesclando textos com desenhos, mas em páginas apartadas. A relação de edições da coleção "BIG" que incluíam personagens Disney é a seguinte:

- Zé Carioca

- Mickey e a Lâmpada Maravilhosa

- Branca de Neve e os 7 Anões

- Pato Donald vê Estrelas

- Dumbo, o Elefante Voador

- Os Filhos de Bambi

Estes “tijolinhos” provêm de uma criação norte-americana, chamada “Big Little Books”, e foram criados por Sam Lowe no ano de 1932, em plena depressão. Este sagaz empreendedor vendeu à Editora Whitman a idéia de aproveitar sobras de papel dos jornais para imprimir estes livrinhos que, nos Estados Unidos, usualmente variavam de 8,5 x 11 cm com uma lombada de aprox. 3 cm, sendo que a quantidade de páginas era numerosa – usualmente entre 212 e 432 páginas, numa média de 320 páginas. A idéia era que, apesar de grossos, as crianças os pudessem colocar e levar em seus bolsos.

As capas eram de papel cartão a cores, e o texto alternava: nas páginas pares, da esquerda, encontrava-se o texto; nas páginas ímpares, da direita, havia um desenho em preto-e-branco, desenhos normalmente adaptados das historietas originais.

Nos Estados Unidos, o primeiro número de “Big Little Book” foi editado no Natal de 1932, com a historieta “The Adventures of Dick Tracy”.

Enfim, não se trata aqui de histórias em quadrinhos, propriamente ditos, mas de textos ilustrados, que em muito a eles se assemelham.

Os “tijolinhos” também tiveram grande aceitação e disseminação na Argentina. Enquanto no Brasil eles se restringiram aos doze “mini-tijolinhos” já citados da Editora Noite, e os “Tijolinhos típicos” da Coleção “BIG”, do Consórcio liderado por Adolfo Aizen, na Argentina foram editados ao longo de mais de dez anos, entre 1941 e 1952, em 122 edições, conforme se relata abaixo.

O nome “Coleção BIG” vem presumivelmente de seu nome original norte-americano: “Big Little Book” – no Brasil – “Coleção BIG”, apesar de que, “BIG” certamente é uma ironia e não corresponde ao seu vero tamanho.

Até este momento, contudo, tivemos apenas "tiras" ou "histórias ilustradas", em que se mesclavam textos com ilustrações, estes desprovidos de balões. Eram ainda "textos ilustrados de contos", ou "proto-quadrinhos", ou "quadrinhos atípicos".

Foi, entretanto, com a constituição da Editora Brasil-América (EBAL) por Adolfo Aizen, no Rio de Janeiro, em 1945, que os personagens Disney passaram realmente a figurar mais amiúde.

 

EBAL foi a primeira editora no Brasil a lançar revistas apenas com histórias Disney: de 1946 até 1948 publicou 17 edições das "Seleções Coloridas" (impressas na Argentina, porque não havia recursos gráficos adequados no Brasil), 13 das quais continham histórias com personagens Disney (edições 1 a 10 e 12, 14 e 16). Graças a essa publicação, os leitores Brasileiros puderam apreciar as obras de Barks e Gottfredson, bem como as criações do artista Argentino Luis Destuet, que ilustrou duas histórias com o Donald.

Depois do cancelamento das "Seleções Coloridas", a EBAL lançou outra série chamada "Nova Coleção Walt Disney", no fim dos anos 40, impressa em preto e branco em formato retangular que durou apenas 8 números.

Não foi porém o famoso HQ "Pato Donald", todavia, a primeira publicação em quadrinhos dos personagens de Walt Disney no Brasil. Além destas inserções na forma de "tiras" e "cases" específicos em quadrinhos de que se cogitará posteriormente (afora inúmeras aparições na forma de textos em prosa), é fundamental informar acerca dos dezessete exemplares das "Seleções Coloridas" (a que chamaremos - "SC"), editadas pela Editora EBAL.

Embora não fossem publicações exclusivas de historietas "Disney", vários destes dezessete exemplares foram integralmente dedicados a eles. Em específico, destas dezessete, somente as edições de números 11, 13, 15 e 17 traziam personagens outros. Os exemplares que não continham quadrinhos "Disney", de fato não continham nenhum, como que "segregando" "Disney" vs. "non-Disney" em edições diversas.

 

Relação dos Títulos das Seleções Coloridas "Disney":

 1 - O "crack" Pato Donald * Donald e o Pica-Pau

 2 - Mickey educando Terça-Feira

 3 - Donald e o Anel da Múmia + Esportes de Inverno

 4 - Mickey em Missão Secreta

 5 - Os Filhos de Bambi

 6 - Donald em Catch-as-catch-can * PD vendedor

 7 - O Pequeno Lobo Mau

 8 - Mickey na Idade da Pedra

 9 - Donald e o Tesouro do Pirata

10 - Branca de Neve e os 7 Anões

11 - (non Disney)

12 - Mickey e a Caixa Eletrónica

13 - (non Disney)

14 - Donald no Alasca

15 - Resoluções

16 - Bambi

17 - (non Disney)

 

         

Seleções Coloridas #1, #2, #3 e #4

         

Seleções Coloridas #5, #6, #7 e #8

    

Seleções Coloridas #9, #10, #12, #14 e #16

         

Seleções Coloridas (non-Disney) #11, #13, #15 e #17

 

Entretanto, representava seguramente uma vanguarda corajosa a edição naquela época, de revistas totalmente coloridas e já no formato clássico do HQ - ou seja, histórias com balões, etc...

De fato, o editor Adolfo Aizen iniciou esta série em 1946, que, com a periodicidade mensal, perdurou por dezessete meses, ou seja, dezessete exemplares de SC - as SC foram acometidas de morte súbita e prematura em 1948, após somente 17 exemplares e duas primaveras...

As SC possuíam as mesmas dimensões que teria o PD(BR) a ser editado posteriormente, sic,: 19,5 cm (largura) x 28 cm (altura). A maior parte das histórias Disney publicadas eram de Barks e Gottfredson, porém com acentuada participação do desenhista argentino Luis Destuet (v. Seleções Coloridas 1 e 6), e que foi responsável pela criação das primeiras historietas Disney na América Latina (e inclusive desenhou dezenas de capas das revistas "El Pato Donald") da Editora Abril na Argentina.

A curta duração da coleção SC instiga aos colecionadores, ensejando diversas explicações plausíveis.

Uma destas liga o fato de que, tanto as edições das SC brasileiras, como o PD(BR) em seus anos iniciais, foram impressas na Argentina, nas oficinas ou sob a supervisão da Editora Abril na Argentina, e que casualmente havia sido fundada anos antes por Cesare Civita, irmão mais velho de Victor Civita.

E é o de que nos ocuparemos na sequência.

A revista "El Pato Donald", que aqui referiremos por PD(AR) muito provavelmente está por trás dos bastidores deste episódio. Surgida anos antes - o número 1 foi editado mais precisamente em 18 de julho de 1944, esta revista também foi a primeira edição da Editora Abril Argentina e a primeira edição realmente em quadrinhos na América Latina e, quiçá, fora do seu idioma nativo (inglês). Observa-se que os irmãos Civita, emigrados dos Estados Unidos, numa época em que a Itália ainda se debatia com as sequelas e rigores da Segunda Grande Guerra, escolheram países vizinhos da América Latina para tentar repetir o sucesso destas publicações na América do Norte.

Cesare e Victor Civita foram empresários ousados e otimistas, comparáveis com o próprio Walt Disney em termos de audácia. Victor, nascido em 1907, era o irmão mais novo de Cesare Civita, este nascido em 1905, e que fundara no início dos anos 1940 a “Editorial Abril S.A.” em Buenos Aires, Argentina. Victor Civita, embora italiano de origem, viera a nascer em New York, durante uma visita de seus pais aos Estados Unidos da América do Norte. Passou a infância na Europa, mas acabou decidindo-se por migrar, quando tinha a idade de 40 anos, para a América do Sul. Viera a chamado de seu irmão Cesare Civita, à época já firme no comando da “Editorial Abril S.A.” de Buenos Aires. Presumivelmente por intermédio dele é que Victor Civita pressentiu que a Disney estaria buscando alguém que pudesse representar seus interesses na parte lusa da América do Sul, posto que “El Pato Donald” argentino, nos idos de 1947, já beirava a 200 números editados, e vinha sendo comercializado em vários países de fala hispânica, tais como – Chile, Uruguay, México, etc...

Antes de iniciar a revista “El Pato Donald”, em 1944, todavia, Cesare Civita e sua “Editorial Abril S/A” iniciaram em agosto de 1941 a série “Pequeños Grandes Libros”, que foi a precursora no Brasil dos “tijolinhos” – conhecidos como “Coleção Walt Disney”, da Editora Noite, e “Coleção Big”, do Consórcio liderado por Adolfo Aizen, já referidos no ponto específico.

A título de curiosidade, desde já pode-se ver a preocupação de Cesare Civita com a “opinião do mercado”. O primeiro número da coleção “Pequeños grandes Libros”, de agosto de 1941, intitulado “El Pato Donald pierde la paciência”, não grafava o número 1, mas sim, número 1101. Talvez para impressionar aos “colecionadores distraídos” que já houvessem sido editados mil e cem números anteriores.

No curso de doze anos, a Editorial Abril S/A publicou na Argentina 122 “pequeños grandes libros”, os chamados “tijolinhos argentinos”, numerados desde o número 1101 ao 1222. O último exemplar, de número 1222, portava a capa e a historieta de “Búfalo Bill”

Em sua maior parte, tratava-se de reimpressões de historietas, como “Mickey y el submarino pirata”, “El Pequeno Lobo feroz”, várias de Donald, sendo que o número 1209 é tão raro, que vários colecionadores Disney sustentam que este número sequer existiu. De Mickey, foram editadas vários, entre eles: “Mickey en la Legión Extranjera”, “El bandido del Rancho Dude”, “En la Isla del Cielo”, “Las Aventuras de Robin Hood”.

Observe-se que as historietas equivalentes em quadrinhos acabaram saindo posteriormente nas próprias revistas “O Pato Donald”, no Brasil, e “El Pato Donald”, na Argentina, ou na “Gran Historieta” argentina, e na revista “Mickey” brasileira (veja-se, por exemplo: “Uma Ilha no Céu” – Mickey Brasileiro número 12.

PD Argentino #1

Ora, quando foi editada a revista SC número 1, a revista PD(AR) já tinha passado do seu centésimo número, o que demonstra que os irmãos Civita presumivelmente já sabiam do potencial económico latente da revista, e não é de se espantar se algum "lobby" indireto dos irmãos junto à Walt Disney Corporation minou prematuramente a iniciativa de Aizen com suas "Seleções Coloridas".

Após o curto período das "Seleções Coloridas", a Editora EBAL viria ainda a publicar, no final dos anos 1940, a "Nova Coleção Walt Disney", totalmente em preto-e-branco e em formato retangular e comprido, com péssima qualidade de impressão - o que dá azo e reforça a premissa de que os irmãos Cesare e Victor Civita de certa forma estavam pressionando para que suas publicações ficassem com a exclusividade dos "Quadrinhos Disney" no Brasil e na Argentina, especialmente os coloridos.

Com poucos exemplares publicados (presumivelmente...) no Brasil, na época mais atrasado em relação à Argentina em termos de parque gráfico, a série quedou fadada ao fracasso, terminando também prematuramente no oitavo número.

      

Nova Coleção Walt Disney #1, #5, #6 e #8

Em 1955 a EBAL viria ainda a tentar a "Coleção Encantada", a qual dedicaria seis de suas doze edições aos Quadrinhos Disney (as demais para a "Turma do Pernalonga"), não havendo prosperado tampouco.

Contrariamente ao PD(BR), o PD(AR) desde sua primeira edição já era semanal. Tanto é assim que a edição número "1" foi editada em Buenos Aires em 18.07.1944, o número 2 circulou em 25.07.1944, o número 3 em 01.08.1944, e assim passou a ocorrer sucessivamente.

   

PD Argentinos #2 e #3

O PD(AR) desde seu início e até o alvorecer da década de 1950 consistia de uma revista mista, apresentando historietas dos personagens Disney, bem como de outros personagens comuns à época.

Diferentemente das SC, o PD(AR) apresentava em todas as edições um misto de personagens - isto pois nas SC havia uma segregação de natureza dos quadrinhos por edição.

Até a permissão de edição do PD(BR) #1 em 1950 o formato do PD(AR) variou consideravelmente no tempo. Em suas edições iniciais este era impresso em papel jornal da modalidade "cerado", que conferia um brilho especial à capa e maior gramatura às folhas. Media então 19 cm (largura) X 26,5 cm (altura). Este papel de gramatura de melhor qualidade durou aprox. até a edição número 50, que corresponde a meados de 1945.

Passados aproximadamente três anos, com a edição do PD(AR) 169, de 07.10.1947, as dimensões do formato aumentaram, passando à dimensão de "quase" 20,0 cm (largura) x 30,0 cm (altura) - o que é um dos maiores formatos de quadrinhos Disney jamais editados inclusive posteriormente, dentro ou fora dos Estados Unidos da América, se é que não é o maior. Deixaremos aos leitores deste "site" apresentarem provas ou evidências de HQs de maiores dimensões que estes em outros países do mundo, pois este Autor os desconhece.

Como exemplo para cotejo, seguem em anexo os scans do PD(AR) números 169, 170, e 171, datados respectivamente de 07, 14 e 21.10.1947.

        

PD Argentinos #169, #170 e #171

    

PD Argentinos #133, #136, #165,#195 e #197

Um aspecto que marca o PD(AR) é a enorme pulverização das historietas: editava-se, por exemplar, apenas uma página, ou duas, no máximo três páginas de cada história, o que obrigava o leitor menos interessado ou eventual, a imediatamente tornar-se colecionador... uma história de 20 páginas, por exemplo, levava de 10 a 15 exemplares para poder ser lida inteiramente, o que significava, na prática, esperar de 3 a 4 meses... e se fossem histórias compridas... os HQs convertiam-se quase que em "folhetins" que passavam de um ano...

Sem gracejos com os companheiros de além-fronteira, quase que se poderia dizer: gerar leitores de quadrinhos "no cabresto"...

O PD(AR), diferentemente do brasileiro, que em suas 21 edições iniciais, tinha apenas a capa ou mais uma folha colorida, quase que intercalava páginas a cores e páginas preto-e-branco. O número de páginas variava entre 24 e 32 páginas por edição. Em sua maioria, possuíam 32 páginas, porém já nos últimos exemplares de formato grande, em 1951, revezavam-se exemplares de 16 e de 32 páginas.

Entende-se, talvez, a necessidade de Adolfo Aizen intercalar publicações com quadrinhos Disney e quadrinhos "non-Disney" nas suas Seleções Coloridas de 1946 a 1948 - por pressões da própria "Walt Disney Corporation" (ou "WDC") nos EEUU.

A Editora Abril na Argentina, sob a batuta de Cesare Civita, decidira ao enfrentamento com a "WDC", tanto que sofria pressões e sanções administrativas, que culminaram numa batalha judicial.

Após três anos lutando com base em liminares "pró" e "contra" a mescla dos quadrinhos "non-Disney", não mais tolerados pela WDC, finalmente, em dezembro de 1948, a Justiça Argentina dá ganho de causa definitivo à WDC.

Não se conhecem detalhes dos contratos originais entre a “Editorial Abril”, de Buenos Aires, dos irmãos Civita (na época Victor assistia seu irmão Cesare Civita) e a “WDC”, mas é de presumir-se que, por sua vanguarda – as tratativas ocorreram de 1942 a 1944.

Em tal época, estando Europa e Estados Unidos envolvidos na Segunda Guerra Mundial, havia uma tolerância inicial, por parte da WDC à presença de personagens “non-Disney”, mesmo pois o mercado local não era grande, e a revista portenha tinha a pretensão ser semanal, periodicidade esta que cumpriu religiosamente de 19.07.1944 a 08.02.1949, sem uma única falha.

Manter, naquela época, uma publicação semanal, de 32 páginas, com quase a metade de suas páginas coloridas, num mercado extremamente reduzido como era a Argentina, e já desde 1944 na vanguardíssima sistemática de "quadrinhos com balões", por si só, demandaria um estudo específico.

Este êxito seguramente tinha suas causas no "boom económico" pelo qual passava a vizinha República em meados dos anos 1940. Além disso, credite-se parte do êxito desta publicação semanal ao processo de "fidelização dos leitores no cabresto", com a divisão infinitesimal das historietas, bem como ao grau de exigência e sofisticação do mercado portenho, com uma classe média enriquecida pelas exportações de víveres a um mundo faminto - então em plena Segunda Guerra Mundial, e, especialmente, pela introdução das páginas "non Disney", em especial, clássicos do desenho no género "cult", bem como "westerns" e super-heróis - enfim - leitura para uma variada gama etária.

A edição do PD(AR) número 239 do PD(AR), datada de 08.02.1949, porém, representa uma marca. Sucumbentes no litígio e sujeitos inclusive à prisão se descumprissem a ordem judicial definitiva, os Civita passaram quatro semanas sem editar o PD(AR), que surge no seu número 240, datado então de 15.03.1949, com uma das maiores mutilações da história dos HQs.

PD Argentino #239

Dos sete títulos de histórias com personagens "non-Disney" que vinham sendo veiculados pelo PD(AR) até o imediatamente anterior - 239 - quatro deles foram literalmente fechados "a fórceps": numa mesma edição foram encerradas as historietas com o personagem épico "Jacinto", o "western" "Oro del Río" (Ouro do Rio), o drama "Atolín Trágico" e o cósmico-futurístico "Vuelo Infinito" (Vôo Infinito). Numa penada foram encerrados em uma ou duas páginas e já na edição do PD(AR) 241, de 22.03.1949, substituídos por quadrinhos "Disney".

     

PD Argentinos #240 e #241

Mais duas historietas - o policial com "Inspetor Slomp" foi encerrado na edição do PD(AR) 245, datado de 19.04.1949, - e o épico "Herón en Cartago" (Herón em Cartago) terminou no PD(AR) 250, datado de 24.05.1949.

PD Argentino #250

Tudo indicava que os Civita foram literalmente "forçados" a um acordo com a WDC, pois a partir do exemplar PD(AR) 251, de 31.05.1949, os HQs eram quase que puras revistas Disney, com uma única exceção - o épico "Gène Autry", que também viria a ser editado no Brasil, posteriormente.

PD Argentino #251

Talvez por sua extrema popularidade, os Civita literalmente "arrancaram" uma concessão da WDC, no sentido de permitir-lhes manter o seriado "Gène Autry" no meio de uma publicação então quase puramente Disney, no seu restante, o que perdurou até o PD(AR) 306, datado de 20.06.1950.

    

PD Argentinos #306 e #307

Com a publicação do PD(AR) 307, em 27.06.1950, cumpriu-se, então e finalmente, a última cláusula do "Acuerdo General" entre "los hermanos Cesare y Victor Civita" e a WDC, e assim, abriram-se finalmente as portas para que no mês seguinte, a WDC não mais impusesse quaisquer óbices à circulação do PD(BR) número 1, através de edições mensais, enquanto que o PD(AR) seguia semanal - e ambas as publicações puramente Disney.

Seguem abaixo as capas dos PD(AR) 308, 309, 310 e 311, que correspondem cronologicamente ao PD(BR) número 1, todos de julho de 1950, montados e impressos nas mesmas gráficas da Editora Abril Argentina.

 

                  

A revista PD(AR) é provavelmente a edição que mais variou seu tamanho entre as antigas revistas de historietas em quadrinhos de Cesare e Victor Civita. Após a fase inicial, entre os números 1 a 169, em que media 19 x 26,5 cm – passou à fase do formato gigante, de 20 x 30 cm, entre os números 170 a 357.

Com a edição do número 358 finalmente a revista reduz de tamanho, passando ao tradicional “formatinho”, de 15 x 22,5 cm, tamanho este que posteriormente, com pequenas diferenças, também foi adotado pelo PD(BR) a partir de seu número 22, em abril de 1952.

A seguir, temos a fase do “micro-pato”, a menor revista PD já editada na América Latina – tamanho 15 x 19 cm, o que perdurou entre os números 387 a 439.

Com o número 440, volta o tradicional “formatinho”, levemente reduzido para 15 x 22 cm, o que ocorreu entre os números 440 a 927.

               

PD Argentinos #288, #706, #723 e #928

Entre os números 707 e 723, a vinheta “el Pato Donald” muda de feições – não sendo mais aquela clássica e tradicional que, no Brasil, vigeu até o PD(BR) 1468, no ano de 1979. Na fase final do PD(AR), os números 928 a 996, as revistas possuíam a dimensão de 17,5 x 27 cm.

Em 1963, em função de um longo processo de acirramento de divergências, e não tendo o mesmo jogo de cintura e tolerância de seu irmão Victor, Cesare Civita e sua Editorial Abril S/A perdem os direitos de seguir editando as revistas Disney na Argentina, conforme se relata adiante.

Para que não fique no olvido, informamos que, talvez para contentar o público argentino àvido por leitura de histórias completas (ou em apenas duas edições), a Editorial Abril local publicava, já a revista mensal "La Gran Historieta".

A revista “Gran Historieta” foi concebida por Cesare Civita para atender a um público infantil de classes mais abastadas, que muito reclamavam de ter que adquirir vários exemplares para, combinando muitos, às vezes, muitas dezenas de exemplares, chegar a uma “história completa”.

Considerando-se que as historietas Disney possuíam em média de 15 a 30 páginas, e considerando-se que eram editadas no “PD(AR)” em média apenas 1 página de cada história por revista (no máximo duas, e olhe lá....), facilmente se chega à conclusão que se levava em média dois a três meses para poder ler uma história completa. E sendo histórias longas, especialmente as “non-Disney”, como Gène Autry, Cavaleiro Negro, etc..., às vezes duravam quase um ano...

O leitor exigente, especialmente o portenho, começou a não aturar esta demora. E para ele Cesare Civita preparou a “Gran Historieta”, que também chamaríamos por “GH”. Ou seja, como o próprio título diz, uma “grande historieta” completa, ou quase, para poder ser lida em uma síncope. Ao contrário do “PD(AR)”, cuja periodicidade era semanal, a “GH” tinha pretensão de ter sua periodicidade quinzenal, mas, na prática, era uma publicação bimensal, pois “aparece el primer y tercer martes de cada més”.

Em junho de 1946 foi editado o número 1, com a capa “Los Hijos de Bambi”, com o tamanho de 20 x 28 cm, ou seja, um pouco menor que o “PD(AR)” em seu maior formato. E assim seguiu até o número 102. A partir do número 103, o tamanho da “GH” reduziu-se um pouco para 18,5 x 26 cm, ou seja, um pouco menor que o “PD(AR)” em sua primeira fase. Durou pouco. Logo após, o número 121 marcou um tamanho bem reduzido, ou seja, de 14,5 x 20,0 cm, o que durou até o número 253. E do número 254 até o 315, último número da revista “GH”, esta passou ao tamanho de 18,5 x 26,5 cm.

               

Gran Historieta #26, #32, #56 e #58

Um ano após a redução ao seu terceiro e menor dos seus formatos, Cesare Civita anunciou, em publicidade de página inteira no seu minúsculo número 150, datado de 17 de março de 1953, no seu melhor estilo, que “La Gran Historieta se agiganta... Ahora, desde el próximo número, 12 páginas más a todo color... con chistes... con una formidable historieta completa... Más grande que nunca...”.

Tudo ilusão, nada ocorreu, os números 151 a 253, durante mais de dois anos ainda, permaneceriam no seu pequeno formato de 14,5 x 20 cm...

Gran Historieta #270

Ao final de 1956, assim como ocorreu com o “PD(AR)”, a “GH” deixou de circular por aproximadamente dois meses. Tratava-se da famosa “crise do papel”, que viera a atingir o Brasil somente alguns meses depois, em meados de 1957. Naquela época, no Brasil, Victor Civita conseguiu circunscrever o problema, adotando para suas publicações “PD(BR)” e “Mickey” o papel “jornal-acetinado”, mais fino, quase de seda, que marca revistas como o MK58 e o MK59, assim como os “PD(BR)” entre 295 e 305.

O último título foi “Buscando a um Campeón”, GH-315, de 15 de dezembro de 1959. Destituída da frescura juvenil que lhe caracterizou os primeiros anos, parecia uma cópia barata das publicações mexicanas que começaram a invadir toda a América Espanhola, e que precipitaram, alguns anos mais tarde, o final dos quadrinhos Disney pela Editorial Abril S/A de Cesare Civita.

Embora o relato da evolução do PD(AR) pareça um pouco fora de contexto para um colecionador que pretenda ater-se somente às coleções Disney brasileiras, uma realidade que não pode ser negada é que o PD(BR), no fundo, é um "filhote" do PD(AR), fruto do que ele chegou a ser em julho de 1950, pois resultado de mais de seis anos de acertos e desacertos dos irmãos.

Como colecionador de revistas puramente brasileiras, fui forçado a abrir uma exceção e incluir o PD(AR) - somente da série editada pela Abril Argentina de 1944 a 1963 - devido a esta quase "simbiose" que ocorreu entre elas, especialmente até o final dos anos 1950.

A título de ilustração, pouco antes de iniciar-se a publicação do "Pato Donald" no Brasil, a Editora Novaro, no México, iniciou-se entre 1949 e 1950.

As "Organizaciones Editoriales Novaro", capitaneadas por Luis Novaro, mantinham a "Sociedad Editora América", que se encarregou desde então de publicar os "Cuentos de Walt Disney" ("Contos de Walt Disney"), em edições puramente "Disney".

Não tivemos acesso a números muito antigos desta série, mas sabe-se que iniciaram mensais e posteriormente, e por dilatados anos, foram publicados quinzenalmente.

A título de exemplo, segue o scan da capa do "CuentWD" número 209, de 05.02.1960.

Cuentos de Walt Disney #209

Sabe-se porém que o formato da revista e o logotipo de Editora variaram consideravelmente nestes anos, o que prejudica uma acompanhamento contínuo, como foi com o PD(AR), até que a Abril perdeu sua concessão nos anos 1960, e como é no Brasil até hoje.

No México, na década de 1950, os "CuentWD" possuíram três formatos editoriais, o primeiro com o timbre "EMSA", a seguir "ER", e finalmente "SEA", conforme o desenho apresentado.

Na década de 1960, houve dois formatos: "N" (de "Novaro" presumivelmente...) num círculo. Após o formato de uma "àquila" (águia), até 1966. De 1966 a 1984, prevaleceu o formato chamado de "EN" ("Editorial Novaro").

               

Cuentos de Walt Disney #24, #42, #300 e #1030

Os quadrinhos mexicanos de Novaro tiveram grande influência no mercado editorial latino-americano, exceto no Brasil, pelo fato de serem baratos e acessíveis, apesar de seu material ser de qualidade inferior. Ainda que Cesare e Victor Civita tenham começado suas edições de “PD(AR)”, “GH”, “PD(BR)” e “Mickey” com parca qualidade gráfica e papel jornal de baixa qualidade, a realidade é que estes foram melhorando o parque gráfico e artístico, ao passo que Novaro ateve-se, ao máximo, ao lema “low cost, low fare”.

De fato, desde o início, Cesare Civita contava com artistas, tais como Luis Destuet, que eram responsáveis pelo desenho, no mínimo, das capas de suas publicações. Havia interesse de manter equipe independente da Disney Americana. Novaro, no México, a sua vez, estava diante de um mercado diferente. Neste ponto temos que adentrar os aspectos sócio-político-econômicos vigentes na América Latina dos idos de 1950.

Tanto no Brasil como na Argentina, este período esteve associado à ascenção dos partidos trabalhistas e sindicalistas ao poder. Getúlio Vargas e Juan Domingo Perón instituíram, cada um a seu modo, redes sindicalistas e partidos trabalhistas que penetraram fortemente nas instituições públicas de seus países, fomentando forte consciência reivindicatória sindical, e especialmente num mercado explosivo e altamente contaminado pelo meio esquerdista sindical, que são os jornalistas.

Já no México o cenário era outro. A Revolução de Pancho Villa e Emiliano Zapata, que viera a derribar do poder a República Velha mexicana no seu símbolo máximo – Porfírio Díaz, em 1910, institucionalizara-se quase que na forma de um “partido único” – o “PRI – Partido Revolucionário Institucional”, desde 1921. Temerosos do que ocorrera com a revolução Bolchevique, de 1917, no Império Russo, os Estados Unidos da América rapidamente chegaram à conclusão que seria mais “fácil e barato”, simplesmente, “corromper” e “formar amizade” aos novos Governantes Mexicanos, pavimentando-se-lhes a tomada do Poder no México. E assim ocorreu. Desde 1921 um Governo Populista instalou-se em solo mexicano, porém, em sua longa permanência no Poder (a rigor, o “PRI” somente foi defenestrado na década de 1990, quase setenta anos após a tomada do poder) – o nível de corrupção era bastante alto, e facilmente cedia às pressões do poderoso vizinho ao Norte e de suas corporações.

E assim, efetivamente, a “WDC - Walt Disney Corporation” tinha muito maior ingerência no México que com os irmãos Civita, no hemisfério Sul.

Enquanto Brasil e Argentina estavam recém ensaiando seus primeiros passos em termos de Governos Populistas, na década de 1950, o México já estava “mais que calejado” e as políticas populistas já estavam encasteladas no Poder há décadas.

Isto fazia destes países – mercados consumidores distintos. Enquanto no Brasil e na Argentina – as publicações eram destinadas basicamente a no máximo 20% da população – e olhe lá – no México – estas eram destinadas a fatias muito maiores – uma população-alvo de quase 50% dos mexicanos.

No Brasil e na Argentina os leitores de quadrinhos típicos eram a meninada urbana de classe média privada dos grandes centros, basicamente formada por filhos de comerciantes, industriais, profissionais liberais, médicos, advogados, professores (estes na época ainda pertenciam à classe média plena...) – no México, a população-alvo incluía o filho do proletariado.

Por este motivo, Novaro insistiu fundo na sua política do “low cost, low fare”, e, catapultado em um mercado interno maior, preços muito mais baratos, mão-de-obra mais barata, “benesses” de uma cooperação mais íntima com a WDC, etc... praticava preços que Cesare Civita, em sua Abril Portenha, não conseguia mais acompanhar.

Além disso, as pressões sindicais dos anos 1950 na Argentina forçavam salários e custos totalmente incompatíveis para Cesare Civita, que começou também a perder seu gordo mercado de HQs hispânicos nos demais países da América Latina para Novaro.

As transformações da “GH” e do “PD(AR)” para o formato final de seus últimos anos – GH254 a GH315, bem como PD(AR)928 a PD(AR)996 constituíram sua última tentativa de sobrevivência.

“Se não puder vencer o inimigo com suas armas, adote as dele...” foi o que pensou Cesare Civita, e descambaram, nesta última fase, suas revistas para um formato de mínima qualidade possível.

Esta, porém, foi a “gota d’água”... as revistas de Cesare Civita passaram a ficar praticamente idênticas, assimiláveis, às de Novaro. Tanto que os últimos exemplares de “GH” eram quase papel-lixo.

Não conseguiu, por um lado, deter os custos de mão-de-obra locais, em função da força dos sindicatos. Por outro lado, a drástica redução na qualidade do papel, impressão, etc... afugentaram-lhe a preferência do consumidor jovem abastado, integrante das classes “A” e “B”, que passaram a não ter mais motivos na fidelização das publicações da Abril.

E assim, Novaro, com suas política mexicana de “low cost, low fare”, conseguiu penetrar fortemente na Argentina, destruindo seu maior competidor na América Espanhola, vitória este que consagrou-se com o fim do PD(AR), em 1964.

Simultaneamente, os anos de 1950 abriram o mercado dos demais países da América Espanhola para Novaro, que via suas revistas tomarem as bancas no Chile, Uruguay, Colômbia, Venezuela, Paraguay, etc..., e assumirem o sacrossanto espaço que Cesare Civita tanto queria para sua Editorial Abril...

Victor Civita e a Editora Abril Brasileira, por sua vez, assistiram a este processo sob menor pressão e com menos sofrimento, principalmente em função do idioma. Efetivamente, português fala-se apenas no Brasil, em termos de Américas...

Este ponto, que era visto, na década de 1940 e início da década de 1950, como a “chave do sucesso” de Cesare Civita, e explicava também porque “no Brasil tudo caminhava com mais atraso e de forma mais lenta...” – acabou poupando Victor Civita e servindo de “boomerang”, voltando-se contra Cesare Civita.

Cesare Civita detinha o idioma universal da América Latina – o espanhol – o que permitiu que suas historietas fossem lidas desde Ushuaya até San Diego, “desde la Tierra del Fuego hasta la Califórnia”, como dizia. Com um maior mercado, ficou exposto à maior concorrência.

Victor Civita, mais hábil, pavio menos curto, mais diplomático, evitou maiores atropelos, procurou costurar políticas sem enfrentamentos, com crescimento vegetativo mas constante. Sendo assim, evitava confrontos com fornecedores ao máximo, investia o necessário, mas sem colocar os passos anteriores sob risco, evitava confrontos laborais e políticos.

Tanto que, nas crises do papel, enquanto Cesare Civita retirou a revista de circulação, Victor Civita trocou o papel, reduziu um pouco a tiragem, aumentou um pouco o preço. Quando faltava tinta no mercado, chegou a inventar o célebre caso do “sumiço das tintas do Pato” (vide PD(BR) 384 a 391). Para evitar confrontar-se com a legislação getuliana xenófoba do início dos anos 1950, simplesmente usava seu amigo Giordano Rossi como “Diretor” da Editora Abril Brasileira, permanecendo “nos bastidores”. Giordano Rossi, na verdade, funcionava-lhe como um “laranja”.

As edições espanholas de Novaro chegaram a ser vendidas no Brasil no final da década de 1950 até os meados de 1960, porém nunca com o sucesso que o Editor Mexicano esperava. O Brasil dos anos 1960 não estava preparado para a globalização, e era praticamente inconcebível para as classes médias e altas daquela época, adquirir gibis em castelhano para seus filhos, se mal estavam a aprender português nas escolas. Talvez somente em parte do Rio Grande do Sul, em função da proximidade da fronteira hispânica, houve alguma venda.

Pouparam Victor Civita de uma débâcle entre 1960 e 1964 - não somente a diferença de idioma, a habilidade política, mas também a ideologia das esquerdas da época.

Enquanto no México, após estarem já há décadas encasteladas no Poder e dele usufruindo suas tradicionais benesses, as esquerdas não desprezavam tanto Walt Disney e nem pautavam maiores discriminações, no Brasil e especialmente na Argentina, as publicações Disney eram consideradas “puro instrumento do imperialismo”. Até hoje circulam inúmeras publicações demonstrando a manipulação ideológica por detrás das revistas Disney – entre elas faz muito sucesso : “Para Leer el Pato Donald – Comunicación de Masa y Colonialismo”, de Ariel Dorfman e Armand Matellart – Siglo Veintiuno Editores Argentina. No Brasil, as manifestações contra o colonialismo cultural provinham especialmente dos intelectuais de esquerda de maior proeminência da época, destacando-se os pronunciamentos de Celso Furtado, Fernando Henrique Cardoso e Luiz Carlos Bresser Pereira.

Sendo assim, não surgiu interesse, por exemplo, durante o governo populista de João Goulart, de um esforço de maior disseminação das revistas Disney no Brasil, nas classes “C” e “D”, como o ocorrido com Novaro, no México. Registre-se, por ironia, que o acesso dos quadrinhos Disney às classes “C” e “D”, ainda que em modestíssima escala – em função do apego cibernético atual - somente oportunizou-se na década de 2000 com o Governo Lula que, nos melhores modelos mexicanos, promoveu um forte processo de “desideologização das esquerdas”, relegando o figurino da xenofobia populista tradicional a um segundo plano.

Em 1964 a Revolução de 31 de Março consagrou, no Brasil, a plena ascensão ao poder da classe privada média e alta, oportunizando para Victor Civita, então sim, um fantástico crescimento de vendas.

Então o que se assiste, entre 1963 e 1966, é um fenômeno impressionante: enquanto a ascensão da Revolução de 1964 catapulta o irmão mais jovem Victor Civita e sua Editora Abril a um sucesso impressionante, abrindo seu caminho para vir a ser a maior Editora da América Latina, o audacioso e vanguardista Cesare Civita e sua Editorial Abril são defenestrados numa derrota retumbante, que interrompe o curso das revistas Disney em seu berço na América Latina.

Enquanto no Brasil, adicionar-se-iam novas publicações desde dezembro de 1963, com o “Tio Patinhas” Brasileiro, e muitas mais, após 1970, na Argentina e nos demais países latino-americanos, com exceção do México, assiste-se ao nascimento e morte de várias publicações, em várias editoras.

Tivemos, assim, a Editora Chilena Zig-Zag, que iniciou suas atividades no final da década de 1950, impulsionada pelo desenvolvimentismo “low cost, low fare” de Novaro, e pressionando as margens de Cesare Civita. Com a derrocada da Editora Abril Argentina em meados dos anos sessenta, foi a Editora Zig-Zag uma das maiores beneficiadas, chegando a atingir quase metade da venda de volume de revistas Disney que Civita vendia em 1960.

Seguem exemplos de capas de publicações da ZIG-ZAG.

         

         

Algumas publicações da Editora Zig-Zag (Chile)

A seguir, os argentinos se reestruturaram e se rearticularam em torno da Editorial Tucumán, que iniciou atividades no final dos anos sessenta, e teve edições regulares até a década de 1990, havendo atingido seu clímax de mercado na década de 1970.

Já vimos que a forte olada que soprou na década de 1960 no Brasil, com a ascensão da Revolução de 1964 ao Poder e a consolidação do Projeto de Poder da burguesia classe média privada, insuflada pelos movimentos privatistas como “Marcha com Deus e a Família pela Propriedade (MDFP)”, que contribuiu enormemente para o sucesso de Victor Civita no Brasil, e não chegou a tempo para salvar seu irmão da desgraça.

Na Argentina, foi exatamente a Editorial Tucumán que auferiu estes lucros, pois o sucesso de suas edições nos anos setenta, até meados dos anos 80, foi incontestável.

         

         

Algumas publicações da Editora Tucumán (Argentina)

Com a derrocada do Plano Austral, implantado pelo Presidente Raúl Alfonsín em 1983, e o retorno da hiper-inflação, no final dos anos oitenta, a Editorial Tucumán soçobrou, abrindo espaço, no plano político para o surgimento dos anos de Carlos Menem na Argentina. No plano editorial, desta vez foram os Civita brasileiros que não dormiram no ponto. Já sob o comando de Roberto Civita, filho de Victor Civita, a ele juntaram-se outros quatro sócios menores, e foi fundada, na Colômbia, nos anos oitenta, a “Editora Abril Cinco”.

A Editora “Abril Cinco” teve por escopo ocupar o espaço editorial vago com as dificuldades econômicas da Editora Tucumán na Argentina, e a redução da presença das publicações mexicanas do Grupo de NOVARO.

A Editoria “Abril Cinco” caracterizou-se por adaptar, de forma muito semelhante, peças já publicadas no Brasil. Aproveitaram-se “ipsis litteris” os formatos das vinhetas de capas tipo “O Pato Donald”, por exemplo, além de várias publicações, traduzindo-as do português ao espanhol. Afinal, a Editora Abril brasileira já estava há tantos anos num mercado, reinando forte e capitalizada, havia aprendido tanto e possuía tanta tecnologia sob todos os aspectos, que seria quase pueril abandonar os mercados vizinhos à sua própria sorte... aliás, foi o que fez em Portugal também.

         

         

         

Algumas publicações da Editora Abril Cinco (Colômbia)

Estas publicações foram definhando e acabaram por fenecer. Nossa explicação está associada à queda em geral da demanda por histórias em quadrinhos, em especial da linha Disney, verificada na década de 1990, e, em especial, na primeira década do século XXI.

Vamos aguardar para ver se alguma retomada reenceta-se ainda na América Latina, como ocorreu, de forma isolada no Brasil, nos últimos anos, fruto talvez da ascensão de novos mercados e novas classes sociais disputando consumo.

Desta evolução no México pode-se verificar o quão importante foi a batalha de Walt Disney e sua corporação, no sentido de buscar solidificar a sua "marca registrada", banindo tudo que fosse alienígena do seio de suas revistas e seus personagens.

A revista em quadrinhos "O Pato Donald - Revista Mensal de Grandes Historietas de Walt Disney", e que doravante estamos referindo tão-somente como "PD(BR)" surgiu em julho de 1950 como o primeiro grande lançamento da Editora Abril no Brasil. Impresso na Editorial Abril da Argentina, atendia, senão a nível nacional, prioritariamente os estados de São Paulo e Rio de Janeiro, tendo alguns (poucos...) distribuidores no Sul, alcançando também escassamente os principais estados da Região Nordeste (especialmente Pernambuco).

PD Brasileiro #1

Para organizar a Editora Abril na Capital Paulista, Victor Civita formou sociedade com seu amigo Giordano Rossi, alugando um pequeno apartamento no centro de São Paulo, e iniciou adaptando e introduzindo os quadrinhos Disney no mercado brasileiro, tomando como referência a experiência de seu irmão Cesare Civita. Na época, contava com apenas um colaborador, Jerônimo Monteiro, uma equipe verdadeiramente “enxuta” de três pessoas.

No Brasil, desde sua génese, não houve as mesclas ocorridas na Argentina. Sob este aspecto, observa-se que Victor Civita, quiçá bem melhor que seu irmão mais velho Cesare, soube penetrar e entender bem a psicologia de Walt Disney e seus auxiliares, tanto que conduziu as publicações sem maiores ruídos que se tenha tido notícia, e sempre em espiral ascendente de vendas, desde seu início em 1950, e pelo menos até sua morte, em 1990.

Um aspecto que normalmente passa desapercebido por vários colecionadores é que esta revista em suas primeiras vinte e uma edições era mensal, e não semanal, como depois veio a ocorrer. De fato, suas primeiras vinte e uma edições foram editadas entre os meses de julho de 1950 e março de 1952, perfectibilizando portanto vinte e uma edições em vinte e um meses calendários. Sua revista coirmã, o "Pato Donald" editado pela Editorial Abril em Buenos Aires (Argentina), estreado seis anos antes, nasceu desde já semanal, porém continha quadrinhos dos mais diversos autores, como já verificamos, o que não veio a ocorrer com o PD(BR), rigorosamente contendo tão-somente quadrinhos Disney.

Estas edições eram editadas no que posteriormente ficou conhecido como "formato americano", maior que o tradicional "formatinho" (o formato tradicional do "Topolino" italiano, e que posteriormente popularizou a revista.

As vinte e uma edições iniciais do PD(BR) possuíam aprox. as seguintes dimensões: 19,5 cm (largura) x 28,0 cm (altura). Portanto, uma tamanho intermediário entre o PD(AR) que vigeu na sua fase inicial (19.07.1944 a 07.10.1947) e sua fase de máximo tamanho (v. dimensões supra (14.10.1947 a aprox. 31.12.1951).

O PD(BR) número 1 foi editado com ca. 82 mil exemplares, o que representa um volume considerável, e de certa forma não explica a escassez desta publicação no mercado brasileiro atual, fazendo com que atinja valores consideráveis (em estado de conservação de "bom a ótimo" há notícia de estar sendo comercializada de R$ 2.500 a R$ 4.000 reais).

Apesar de ser este tipo de nomenclatura bem disseminada, o "formato americano" não constituía, nem mesmo à época, uma dimensão padronizada, pois tanto nos Estados Unidos como em outros países, houve variantes destes formatos. Para terem um parâmetro de comparação, adiante informamos dados sobre o tamanho das edições do PD na Argentina, também editado por uma co-irmã da brasileira, a Editorial Abril.

A Editora Abril estava recém iniciando atividades no Brasil à época, e para efeitos de "marketing", posteriormente, e até hoje, o PD(BR) é considerada a primeira edição da Editora Abril. "Tudo começou com um Pato..." diziam vários epítetos comemorativos nas revistas Disney da Abril, especialmente nas décadas de 1970 e 1980. Controlador da Editora Abril, o ítalo imigrante Victor Civita, desde então, acreditava na força de crescimento desta revista.

Um aspecto instigante é o fato de que, no corpo editorial das revistas "Pato Donald" e "Mickey", assim como das publicações argentinas "Pato Donald" e "La Gran Historieta", não constavam os irmãos Civita como editores ou responsáveis. Talvez a legislação societária da época não permitisse esta faculdade sendo exercida por estrangeiros, ou pelo menos, brasileiros ou argentinos apenas naturalizados. No Brasil, por diversos anos constava sempre "Giordano Rossi" como "Editor responsável".

A redução no formato do PD(BR) ocorreu com o número 22, o primeiro exemplar em periodicidade semanal, editado em 08 de abril de 1952, que passou a medir 14 cm (largura) x 22 cm (altura), portanto, alguns milímetros maior que o formatinho tradicional que perduraria ao longo de toda a segunda metade da década de 1950, bem como das décadas de 1960 e 1970.

O formato reduziu-se, após a Segunda metade da década de 1950 um pouco, para algo como 14 cm (largura) x 21 cm (altura). Este "formatinho" perdurou até a edição de número PD(BR) 1469, sendo que o tipo do papel era o "jornal", o qual veio sendo aperfeiçoado ao longo do tempo. O PD(BR) de número 1470 pela primeira vez cambiou o formato do título da edição, e reduziu as dimensões da revista para aprox. 13,5 cm (largura) x 19 cm (altura), o qual perdura até os tempos modernos, com pequenas variações.

PD Brasileiro #22

Já a redução no formato do PD(AR) ocorreu em duas etapas. Após o câmbio para o formato "mega-pato" (20,0 cm x 30,0 cm), que perdurou por aproximadamente 4 anos, no início do segundo semestre de 1951, a revista ficou reduzida para as seguintes dimensões : 15,0 cm (largura) x 22,0 cm (altura) - mesmo formato do PD(BR) 22 e seguintes.

Veja-se a este respeito os scans dos PD(AR) nºs 364, 367, 369, 370, 371, 372, 373, datados de 31.07.1951, 21.08.1951 , 04.09.1951, 11.09.1951 , 18.09.1951 , 25.09.1951 e 02.10.1951.

 

               

 

                                      

 

No início de 1952, contudo, um pouco antes da redução do "patão brasileiro", os argentinos inauguraram e buscaram "testar" um "mini-formato", com as seguintes dimensões - 14,8 cm (largura) x 19,5 cm (altura), peças que chamam atenção pois quase perdem a forma retangular, quase assumindo forma de quadrado. Vejam os scans das edições PD(AR) números 387, datada de 09.01.1952, bem como 396, de 11.03.1952.

      

PD Argentinos #387 e #396

Ao se examinarem estas capas, observa-se que muitas delas foram posteriormente reprisadas no PD(BR), por exemplo: capa PD(AR) número 370 (setembro 1951) = capa PD(BR) número 24 (abril 1952); capa PD(AR) número 371 (setembro 1951) = capa PD(BR) número 26 (maio 1952).

 

      

PD Brasileiros #24 e #26

De fato, consta que a WDC permitiu desde cedo, nos seus contratos do início da década de 1940, que a Editorial Abril de Buenos Aires mantivesse equipe específica local para o desenho de capas. Embora várias das capas dos PD(AR) tenham sido importadas das publicações norte-americanas (ou algumas européias), em sua maioria foram artes de artistas argentinos.

Estes artistas também contribuíram para o desenho de várias capas dos PD(BR) iniciais. Como ao personagem "Zé Carioca" não era dado na Argentina o relevo que se daria no Brasil, estas capas do Pato Donald em alguma armação com o Zé Carioca pouquíssimas vezes foram aproveitadas na Argentina, se é que foram alguma vez.

Mas isto se devia talvez a maniqueísmos e preferências locais, pois os artistas sabiam compor com o Zé Carioca e efetivamente, várias das capas dos PD(BR), especialmente dos seus primeiros cem números, vieram da Argentina.

Voltando-se ao formato "minúsculo" do PD(AR), este formato reduzido ao mínimo perdurou por pouco mais de ano na Argentina, sendo que, simultaneamente, eram editados "supernúmeros", o triplo ou o quádruplo de páginas (chegando quase a 100 páginas), com o formato de 15,0 cm (largura) x 22,0 cm (altura).

Em janeiro de 1953, o PD(AR) estabilizou-se finalmente no mesmo formato do PD(BR) post-edição número 22, ou seja, com 14 cm (largura) x 22,0 cm (altura). Veja-se a respeito os Supernúmeros PD(AR) número 383, datado de 11.12.1951, e o número 434, de 02.12.1952.

      

PD Argentinos #383 e #434

O PD(AR) e o PD(BR) finalmente alinharam seus tamanhos, o que se manteria até o final da década de 1950. A esta altura, a técnica editorial e gráfica no Brasil já estava bem desenvolvida, e com a estruturação das Empresas, estas passaram a seguir lineamentos distintos no que concerne às suas publicações.

Em próximas etapas, iremos comentar diferenças de editoração gráfica e de apresentação das historietas entre estas três publicações iniciais da Disney na América do Sul - SC, PD(AR) e PD(BR), bem como as variações no número de páginas, para, posteriormente, passarmos à revista "Mickey", que iniciaria no Brasil somente em outubro de 1952, também editado pela Abril.

Apenas a título de "trailer", pode-se observar a similitude de histórias publicadas entre as edições da Argentina e Brasil. O Supernúmero PD(AR) número 383, que por sinal possuía uma capa que posteriormente seria aplicada ao PD(BR) número 60, apresentava "La Cenicienta", que corresponde literalmente a "Cinderela", editada no "Mickey" número 1 no Brasil, dez meses após. Já o Supernúmero PD(AR) número 434 apresentava "Alicia en el Pais de las Maravillas", o que corresponderia à única história do "Mickey" número 2 no Brasil, em publicações praticamente simultâneas.

     

PD Brasileiro #60 e MK Brasileiro #1

A Revista "Mickey", em seus números iniciais, estava a demonstrar que a Editora Abril buscava um público mais selecionado, de maior poder aquisitivo, e que não precisaria ser objeto de "fidelização compulsória" pela separação de uma historieta em várias edições. Equivalia, na Argentina, à publicação "La Gran Historieta".

De fato, a revista possui o título em homenagem ao "famoso ratinho", talvez pela sua popularidade no Brasil, mas não estava dirigida inicialmente ao personagem. Na revista "Mickey" número 1, além de que "Cinderela" ocupava a quase totalidade das páginas coloridas centrais, pouco restava para o personagem "rato" além da participação em uma historieta narrada em forma de texto, que tratava dos "Discos Voadores".

Além disso, há que se referir algumas edições especiais publicadas na década de 1950 no Brasil, muito procuradas por colecionadores, como o Almanaque Disney da Abril de capa amarela, datado de 1954.

Almanaque Disney (1954)

Temos ainda duas publicações na forma de Almanaque da "Editora Orbis", de 1955. Um de Natal, de capa branca, puramente recheado de histórias em quadrinhos, e outro mais dirigido a passatempos, mas com algumas historietas, capa avermelhada.

Não se sabe ao certo por que regime de exceção Civita, sempre cioso de sua seara, abriu esta exceção à "Editora Orbis".

             

Especiais da Orbis

Uma quarta edição especial de "O Pato Donald" foi editada em 1963 pela própria Editora Abril, época em que estava fazendo seus "testes de mercado" para a introdução de uma publicação ainda mais encorpada e totalmente a cores, que viria a ser a Revista "Tio Patinhas", iniciada somente em dezembro de 1963.

O Pato Donald (Edição Especial)

Quando do aprofundamento destes Estudos de "Arqueopatologia", iremos dedicar um capítulo especial para os números iniciais da Revista "Mickey" e para estes quatro Almanaques Especiais.

Conforme vimos, portanto, os Quadrinhos Disney no Brasil, publicados pela Editora Abril de Victor Civita, até meados da década de 1960, foram caracterizados basicamente por duas revistas: o “Pato Donald”, que aqui referimos por “PD(BR)”, e o “Mickey”, também referido por “MK”.

Conforme já relatamos acima, no capítulo que procurou demonstrar a influência dos ventos sócio-político-econômicos nas publicações Disney na América Latina, fica fácil de entender porque estas publicações mantêm-se apenas neste binômio por quase quinze anos, e depois como que “explodem” em inúmeras outras revistas.

A fortíssima concorrência do regime “low cost, low fare” da Editora Novaro, do México – que veio a fulminar o projeto da Editorial Abril na Argentina entre 1956 e 1964 – provavelmente fez Victor Civita colocar “as barbas de molho”. Isto, e mais - o aumento dos custos, as pressões sindicais, as restrições ideológicas das esquerdas, a instabilidade política, até 1964, provavelmente, serviram de fatores para brevar grandes investimentos em aumento de tiragem e de novas publicações Disney, também no Brasil.

A Revolução de 1964, por sua vez, trouxe a estabilidade sócio-político-econômica que Victor Civita tanto precisava. E chegou no tempo certo: vejam que o Golpe Militar na Argentina chegou somente em 1973, com a deposição de Isabelita Perón pelo General Jorge Rafael Videla. Nesta data, já não havia mais como Cesare Civita ressuscitar sua Editora abatida.

Com a estabilidade de compras, salários e preços trazida após 1964, e com o grande aumento da classe média, as revistas “PD(BR)” e “MK” cresceram enormemente de tiragem. Surgiram novos títulos – “Tio Patinhas”, publicação mensal, em dezembro de 1963, e mensal a partir de 1965. O “Almanaque Disney” surgiu também como publicação mensal (inicialmente hexa-anual em 1971), posteriormente – o “Disney Especial”, em 1972, as “Edições Extras”, etc... chegando no seu apogeu a quase meio milhão de exemplares de tiragem, nas décadas de 1980 e início de 1990.

Este fator faz com que as revistas Disney, a partir de 1965, salvo exceções, deixam de ser “difíceis” para os colecionadores. As peças entre 1965 e 1968 ainda apresentam alguma dificuldade de localização, porém a partir de 1968, com tiragens já de várias centenas de milhares, tornam estas peças lugar-comum que pode ser localizado em quaisquer sebos.

Veja-se, portanto, como os fatores históricos e sócio-político-econômicos influenciam o sucesso e a tiragem das coleções, servindo, por conseguinte, de fatores altamente determinísticos na formação do valor das peças.

Na Argentina, encontrar revistas “PD(AR)” entre 1 e 60 é muito difícil, assim como “GH” abaixo do número 30. No Brasil, os “PD(BR)” entre 1 e 30 são bem difíceis, sendo que os primeiros exemplares em tamanho “formatinho” – 22 a 30 – são dos mais difíceis. A revista “MK” no Brasil, entre os números 1 a 10, é mais difícil ainda, tanto que as peças “MK1” e “MK3” são provavelmente as revistas Disney mais caras do Brasil.

A seguir, as revistas “PD(AR)” entre 60 e 200, assim como do 340 ao 400, são bastante difíceis, o que, em termos de valor, no Brasil, equivaleria ao “PD(BR)” entre os números 40 e 130, assim como aos “MK” entre 11 e 50.

As revistas Disney brasileiras, entre os anos 1955 e 1965 vão perdendo valor aos poucos, em função do lento aumento da tiragem. Já na Argentina, os últimos exemplares do “PD(AR)” e da “GH” também se tornaram mais raros.

Fenômeno similar ocorreu no Brasil somente no final da década de 1990. Efetivamente, as revistas Disney entre 1998 e 2005 são bem mais difíceis de serem encontradas que peças entre 1970 e 1995, por exemplo.

Vá a um “site” de venda de quadrinhos Disney antigos no Brasil, e tente buscar peças entre 1970 e 1990: haverá ofertas múltiplas a preços de banana. Já entre 1990 e 2000 a oferta escasseia. Entre 2000 e 2005 são ainda mais difíceis. Somente nos últimos três ou quatro anos, com a proliferação do “cyber-comércio”, as peças Disney estabilizaram-se em menos títulos e, pela proximidade de datas, ainda são encontráveis com certa dificuldade.

Os anos 90 indicam o declínio de leitores das revistas Disney, causados por diversos fatores, o que aqui não pretendemos examinar, pois demandaria muitas páginas de análises.

Além disso, esta Secção de Arqueopatologia busca, basicamente, oferecer aos leitores os elementos essenciais de “arqueologia” relativos às publicações “Disney” no Brasil e América Latina. Estes períodos após 1970 são mais recentes, o volume de edições é muito grande, tanto que revistas Disney das décadas de 1970 em diante podem ser encontradas facilmente em qualquer tipo de sebos e antiquários.

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